Eficiência, conectividade e muita automação. São estes os três vetores globais que guiam os projetos e as inovações dos veículos comerciais apresentados na 65ª edição do maior salão mundial do segmento, o IAA Nutzfahzeuge, realizado a cada dois anos em Hannover, Alemanha. Embora o IAA seja focado nos novos caminhões, ônibus e vans, existe grande valor agregado gerado pelos fornecedores, que é revelado por um número superlativo: eles apresentarão a maior parte das novidades, 226, e ocupam 70% dos 265 mil metros quadrados da área de exposição”, destacou Matthias Wissmann, presidente da associação alemã de fabricantes de veículos e autopeças, a VDA, que organiza o evento.
No que diz respeito à eficiência energética, boa parte dos ganhos é conhecida, veio com a adoção obrigatória da motorização Euro 6 para todos os veículos diesel na Europa a partir de janeiro de 2015. Com a concessão de incentivos para aqueles que adotassem a norma antes, caminhões e ônibus Euro 6 não são exatamente uma novidade, pois foram exaustivamente exibidos no IAA de 2012 e estão à venda na União Europeia, evitando assim maiores desastres no mercado (algo a ser aprendido pelo Brasil). “Essa façanha tecnológica representa avanço significativo na eficiência, à custa de enormes investimentos”, destaca Wissmann.
O dirigente avalia que a indústria atingiu uma espécie de teto tecnológico e, ao menos por enquanto, é difícil obter novos avanços. Ele elenca que, de agora em diante, novas reduções de consumo poderão ser atingidas por melhorias na aerodinâmica dos veículos, uso de materiais e componentes mais leves e treinamento intensivo de motoristas. Wissmann também chama a atenção para a “bem-vinda” tendência de aumentar o comprimento das composições, para levar mais carga com um só conjunto de cavalo mecânico e semirreboque.
Em relação ao controle de poluentes, os modelos Euro 6 também trazem significativo avanço. Comparados com os veículos Euro 5, as emissões dos de óxido nitroso (NOx) são 80% menores e as de particulados caíram praticamente dois terços. “Os caminhões Euro 6 se tornaram máquinas limpas”, diz. Por isso ele avalia que “a essa altura faz pouco sentido econômico ou ambiental buscar novas reduções de gases nocivos”. O que realmente importa agora, diz o dirigente, é desenvolver novas soluções para reduzir ainda mais o consumo de combustível.
ELETRIFICAÇÃO
Uma das respostas a esse desafio é a crescente eletrificação dos veículos comerciais. Quase todos os estandes da Hannover Messe têm algo a mostrar nesse sentido, sejam fabricantes ou seus fornecedores. Antes restrito a furgões urbanos de entregas e alguns ônibus de transporte público de grandes cidades, o trem-de-força elétrico começa a ganhar papel de destaque também nos caminhões pesados de longo curso.
Essa é a aposta de um dos maiores fornecedores do segmento, a ZF, que este ano apresenta em Hannover seu módulo elétrico híbrido no Innovation Truck, um protótipo extrapesado que puxa um bitrem com 25 metros de comprimento e 40 toneladas de carga. É a primeira vez que a hibridização elétrica é aplicada em um modelo deste porte, com um motor elétrico de 160 cavalos acoplado ao câmbio que funciona em paralelo à propulsão diesel. A solução ainda traz um benefício adicional: dentro dos espaços apertados para carga e descarga, o caminhão se movimenta somente com a força do motor elétrico e ainda pode ser pilotado de fora da cabine, por meio de um tablet na mão do motorista.
Em tese, a solução da ZF pode ser fornecida para qualquer fabricante que desejar compra-la. A vantagem é a redução no consumo de combustível calculada em torno de 5%. Pode parecer pouco em relação a um híbrido em uso urbano que economiza de 20% a 30%, mas os caminhões de longo curso percorrem grandes distâncias, portanto gastam muito diesel, assim a hibridização começa a valer a pena.
CONECTIVIDADE E AUTOMAÇÃO
Outro foco principal deste IAA é a conectividade, que entre outras vantagens abre caminho para maior automação dos veículos, com grande uso de sistemas avançados de assistência, incluindo a direção autônoma, em que o motorista pode deixar a condução a cargo um computador em certas circunstâncias.
É o que fez a Mercedes-Benz com o protótipo batizado Future Truck 2025, o primeiro caminhão do mundo com direção autônoma apresentado ao público. Mais do que uma visão do futuro daqui a 10 anos, trata-se de tecnologia real, pronta para uso, à espera de legislação que regule direitos e responsabilidades de uma máquina que toma decisões por si só. A combinação de sensores (radares e câmeras), computadores de bordo e atuadores eletroeletrônicos permite que o veículo entre na estrada e a partir daí faça tudo sem interferência do motorista, que nessa condição pode relaxar e consultar seus e-mails, ligar para casa ou planejar a próxima parada.
Em geral, a inteligência artificial pode trazer grandes ganhos à segurança e ao conforto, pois certas operações como frenagem, redução da velocidade e até mesmo ultrapassagens e desvios de obstáculos podem acontecer automaticamente, sem interferência do motorista. Longe de ser ficção científica, essa já é uma das atrações reais no estande da Mercedes-Benz em Hannover.
“Os veículos comerciais do futuro estarão on-line o tempo inteiro, comunicando-se com outros veículos, com a companhia transportadora e com o motorista”, diz Wissmann. Para o dirigente, na próxima década essa conectividade terá poder de controlar a condução dos caminhões em partes pré-definidas das rotas. “Isso aliviará o estresse do motorista resultante de rotinas cansativas e vai aumentar a segurança das estradas.”
Wissmann defende que todo o desenvolvimento tecnológico apenas reforça a importância do modal rodoviário para a economia global. “Apenas veículos comerciais podem carregar um frete de porta-a-porta, por isso não há como dispensar ou reduzir esse meio de transporte”, diz. Ele dá o exemplo da Alemanha, onde o número de entregas expressas (courier) subiu para 2,7 bilhões de operações por ano. “O IAA também mostra o quanto são importantes os veículos comerciais na vida cotidiana de cada indivíduo”, enfatiza.
SALÃO GIGANTE
O que não falta são empresas querendo um pedaço dos ganhos no mundo dos veículos comerciais – e a Hannover Messe representa essa competição em tamanho superlativo. Este ano o IAA Nutzfahzeuge em Hannover apresenta crescimento de 9% no número de expositores em relação a 2012: são 2.066, entre fabricantes de veículos e implementos e fornecedores de componentes e serviços de 45 países.
O salão de veículos comerciais de Hannover sempre foi um evento internacional, mas a cada edição essa vocação se aprofunda mais com a chegada de novos expositores de fora da Alemanha. Nesta edição os estrangeiros de 44 países somam 1.216 estandes e assim representam 59% do total de empresas espalhadas nos 27 pavilhões da Messe. Esse acréscimo é devido especialmente aos chineses (sempre eles), que só ficam atrás dos alemães e lideram a presença estrangeira com 200 expositores, um aumento de cerca de um terço em relação à edição de 2012. Logo atrás vêm Itália (137) e Turquia (113), outro forte emergente do segmento.
A participação crescente de mercados emergentes no consumo e na fabricação de veículos comerciais atrai o interesse do público da IAA. Tanto que este ano China e Turquia terão um dia inteiro de seminários e debates para cada país durante a realização do salão.
Do Brasil pouco se fala. Apesar de ser o primeiro ou segundo maior mercado de várias marcas europeias de caminhões e abrigar seis fabricantes da Europa, o País recebe atenção insignificante no evento, a não ser pelos lamentos dos executivos-chefes das empresas que estão surpresos e decepcionados com a queda das vendas do mercado brasileiro.
A melhor representação do Brasil no evento é o exotismo de ver caminhões e ônibus com a marca Volkswagen expostos em Hannover, agora como parte da MAN (hoje também integrante do Grupo VW), para a qual a operação foi vendida em 2009. Desde 2006 os modelos feitos em Resende (RJ) marcam presença na feira alemã como opção mais barata para países emergentes ou subdesenvolvidos.
Fonte: www.automotivebusiness.com.br