Citroën e Peugeot, Ford, Hyundai, Nissan, Volkswagen… Cresce rápido a lista de fabricantes nacionais que usam motores de três cilindros, solução em voga por reduzir peso e atritos e aumentar a eficiência, sobretudo na faixa de 1,0 litro de cilindrada. Opção que faltava à Fiat, mas não falta mais: surge agora a linha Firefly (vagalume) de motores, projeto até então conhecido por GSE (Global Small Engine, motor pequeno global), que estreia no Uno 2017 com opções de três e quatro cilindros.
A unidade de 1,0 litro e três cilindros equipa as versões Attractive e Way, enquanto a segunda pode receber a de quatro cilindros e 1,35 litro, também aplicada ao Uno Sporting (veja preços e equipamentos no quadro abaixo). Além do novo “coração” que substitui o da linha Fire, projeto da Fiat italiana da década de 1980, o Uno recebeu retoques no desenho frontal e novos recursos de segurança e conveniência, parte da estratégia de posicioná-lo mais acima do Mobi — que também receberá em breve o Firefly de 1,0 litro.
A versão Attractive vem apenas com a unidade de 1,0 litro e 72/77 cv; como as demais, ganha grade e para-choque dianteiro renovados
Fabricados em Betim, MG, mas com uso previsto também na Europa, os dois motores usam construção modular: um é o outro com um cilindro a mais — ou a menos —, mantendo elementos internos e medidas como diâmetro de cilindros, curso de pistões e comprimento de bielas. Características atuais de projeto são bloco de alumínio, variação do tempo de abertura das válvulas, preaquecimento de álcool para partida a frio e alternador com operação variável (maior quando o motor desacelera, menor quando se requer mais potência). O movimento do virabrequim é levado ao comando único por meio de corrente, como na linha E-Torq (1,6 e 1,75 litro).
A taxa de compressão de 13,2:1, comum a ambas as versões, é das mais altas já vistas no mercado e supera até mesmo as de motores com injeção direta. Outras soluções em favor da eficiência são deslocamento de 10 mm entre a linha central dos pistões e o centro do eixo do virabrequim, que reduz o atrito entre cada pistão e seu cilindro, e a estratégia de uso do variador de válvulas para cargas (aberturas de acelerador) parciais. Nessa condição o sistema atrasa a abertura das válvulas de admissão e escapamento, o que diminui as perdas por bombeamento — as mesmas que fazem o motor desacelerar o carro quando se corta o acelerador. Relação r/l de 0,289 em ambos revela cuidado no projeto para obter suavidade.
Chamam atenção as duas válvulas por cilindro, enquanto a concorrência de três cilindros emprega quatro: a decisão envolveu custos, simplicidade de manutenção e a ênfase em torque em baixas rotações. De fato, nesse quesito o Firefly se sai muito bem: os valores com gasolina e álcool no três-cilindros (10,4/10,9 m.kgf a moderadas 3.250 rpm) deixam para trás a competição de sua cilindrada: 9,7/10,4 m.kgf nos Volkswagens Up, Gol e Fox, 10,2/10,7 no Ford Ka, 10 no Nissan March, 9,4/10,2 no Hyundai HB20, 9,5/9,8 no Chevrolet Onix (o antigo Fire tinha 9,5/9,9 m.kgf). Na versão 1,3 o Uno alcança 13,7/14,2 m.kgf e fica acima de Citroën C3 e Peugeot 208 de 1,2 litro (12,2/13 m.kgf), Onix 1,4 (13/13,9 m.kgf) e Toyota Etios 1,3 (12,4/13,1 m.kgf), além do Uno 1,4 anterior (12,4/12,5 m.kgf).
“Aventureiro” da linha, o Uno Way tem suspensão elevada e acessórios visuais; pode ter ambos os motores e vir com caixa automatizada no caso do 1,3
No caso da unidade de 1,0 litro a Fiat não priorizou potência máxima, que fica abaixo dos adversários: com 72/77 cv, o Uno agora perde para Ka (80/85 cv), Up, Gol e Fox (75/82 cv), Onix (78/80 cv), HB20 (75/80 cv) e March (77 cv). O próprio motor anterior, de 73/75 cv, superava o novo com gasolina. Em contrapartida, com potência específica de 82 cv por litro, o Firefly de 1,3 litro sobressai na categoria: seus 101/109 cv ficam bem diante de Etios 1,5 (102/107 cv), Onix 1,4 (98/106 cv), Gol e Fox 1,6 (101/104 cv), C3 e 208 1,2 (84/90 cv) ou mesmo Up TSI 1,0 (101/105 cv) e HB20 1,0 turbo (98/105 cv). É grande a vantagem sobre o antigo Uno 1,4 (85/88 cv). Com mais 8 cv com álcool o Firefly alcançaria o 1,6-litro de quatro válvulas da marca, usado no Palio.
Como ficaram desempenho e consumo do Uno com os novos motores? Entre as versões de 1,0 litro o 2017 vence por pouco em velocidade máxima (154/157 km/h ante 151/153 km/h do antigo) e aceleração de 0 a 100 km/h (13,6/12,5 s ante 14,7/13,8 s). Como se esperava, o novo 1,3 anda muito mais que o antigo 1,4: a máxima passou de 170/172 km/h para 177 km/h e a aceleração baixou de 11,1/10,8 s para 10,6/9,8 s. Quanto ao consumo, a Fiat ainda não dispõe dos índices pelos padrões do Inmetro para a versão 1,0, mas a 1,3 com transmissão automatizada mostra bons resultados: melhorou de 11,1/7,6 km/l para 12,9/9,2 km/l em cidade e de 12,6/9 km/l para 14,1/10,1 km/l em rodovia, sempre na ordem gasolina/álcool.
Parte da eficiência do modelo 2017 vem de medidas periféricas ao motor, como a assistência elétrica de direção (no lugar da hidráulica), que pode ter acionada a função City para deixar o volante mais leve em baixa velocidade, e parada/partida automática do motor com botão de desativação, item de série no 1,3-litro (antes vinha só no Evolution 1,4). O Uno recebeu também controle eletrônico de estabilidade de tração e assistência de partida em rampa, de série com caixa automatizada e como opção no 1,3 manual, e partida assistida (o motor de partida funciona o tempo necessário, bastando um breve giro da chave).
Com até 109 cv, o Uno Sporting ganhou o desempenho que sua aparência sugeria; decoração inclui itens em vermelho e saídas de escapamento centrais
Na aparência, a Fiat alterou apenas o necessário para que as evoluções não passem despercebidas nas ruas: grade, para-choque dianteiro, rodas e as faixas decorativas do Sporting foram revistas. O interior ganhou nova grafia no quadro de instrumentos e opções de sistema de áudio com tela de 6,2 pol e câmera traseira de manobras. Na composição de versões, o fim da Evolution significa que o motor superior se torna disponível apenas com o visual “aventureiro” do Way ou o esportivo do Sporting: a nosso ver, deveria haver uma opção simples e discreta com o 1,3-litro.
Ao volante
No lançamento à imprensa em Belo Horizonte, MG, o Best Cars pôde dirigir o Uno com ambos os motores em trajetos urbanos, onde a Fiat quis destacar o bom torque em baixas rotações. Com a versão Attractive rodamos cerca de 20 quilômetros na região da Lagoa da Pampulha. Já ao acionar o motor, a impressão é diferente dos outros três-cilindros do mercado pelo ruído pouco mais agudo. Nota-se também certa vibração típica dessa arquitetura: na tentativa de atenuar esse efeito os fabricantes costumam aumentar o coxim superior e com a Fiat não foi diferente.
O que surpreende é a agilidade: com pouco mais de uma tonelada, o torque bem distribuído do Firefly logo se manifesta e o Uno sai “esperto”, vencendo rápido a inércia. Não parece ter apenas 1,0 litro. No trajeto não foi possível andar a mais de 60 km/h, mas para 120 km/h em quinta marcha o cálculo de transmissão indica aceitáveis 3.700 rpm. A caixa é relativamente suave e precisa nas mudanças e os freios redimensionados cumprem bem sua função. A Fiat também recalibrou molas e amortecedores com bom resultado — destaque para a suspensão macia ao transpor valetas e lombadas. A direção está mais agradável com a assistência elétrica, embora o modo City até pareça desnecessário: sem ele, com o volante mais firme, a sensação de controle é melhor.
Construção modular barateia produção; no painel do Sporting, botões do modo City da direção e para desligar a parada/partida automática do motor e o controle de estabilidade.
Passamos depois à versão Sporting 1,3 com caixa Dualogic, comandada (como antes) por botões no console central e alavancas de mudanças junto ao volante. Esse motor cativa pelas respostas rápidas de aceleração e enfrenta os aclives da capital mineira sem perder o fôlego. Como no três-cilindros, fica evidente o torque bem distribuído pela faixa de operação, que dispensa frequentes reduções de marcha para manter a agilidade. A rotação calculada a 120 km/h é moderada, 3.300 rpm (igual para as caixas manual e automatizada), e seu nível de vibrações ficou melhor que o do 1,4, que era um pouco áspero, mesmo depois das revisões do modelo 2015.
Em termos de suspensão o Sporting usa calibração mais firme, sem chegar a sacrificar o conforto, mas com esse motor a opção mais indicada para quem prioriza maciez é o Way. A direção mais leve em baixa velocidade é bem-vinda (era um pouco pesada) e os freios respondem bem; contudo, o novo patamar de potência justificaria o uso de discos ventilados à frente em vez de sólidos. Quanto à transmissão Dualogic, em bom estágio de calibração, permanece a recomendação: ao perceber que vai trocar de marcha, tire levemente o pé do acelerador e volte a acelerar em seguida, o que a torna mais suave. Fica para a avaliação completa o julgamento do comportamento em rodovia.
A evolução dos motores do Uno foi grande e atende bem às necessidades de um carro deste porte. Os preços subiram, mas houve avanço efetivo em termos de satisfação ao dirigir e do desempenho das versões superiores, sobretudo para o Sporting, que agora dispõe de potência coerente com seu visual. E, ao que apontam os resultados do 1,3, a economia de combustível dos novos “vagalumes” apagará as críticas merecidas pelos motores anteriores.